Muito além da rivalidade Estaduais x Regionais. Uma questão de sobrevivência para os clubes do Nordeste!

Em 2001, quando voltei ao Brasil depois de 3 anos estudando gestão e marketing no esporte, me deparei com um cenário animador. Tínhamos 3 competições regionais. Com destaque para o Rio São Paulo e o Campeonato do Nordeste. Ambos crescendo, com ampla cobertura da mídia, estádios com boa ocupação e patrocinadores felizes. Além, claro, da felicidade das torcidas pela melhora na qualidade dos espetáculos e a inesgotável esperança na vitória.

 

Considerando que não se constrói uma propriedade esportiva da noite para o dia, não havia cenário mais animador. Tudo indicava um novo rumo, algo robusto e capaz de mostrar pelo bom exemplo, o caminho para a melhor gestão e excelência em qualidade para os clubes.

Infelizmente, já em 2002, manobras políticas acabaram com os regionais. Sim, os mesmos regionais acima, lucrativos e positivos para todos. Repito, todos.

 

Curiosamente, também em 2002, assumi a gerencia de marketing do Vitória-Ba. Clube dirigido pelo Presidente Paulo Carneiro à época. Paulo foi um dos principais articuladores e entusiastas da criação da Liga do Nordeste. Ainda lembro de sua decepção com o fim da competição. Mesmo assim, no peito e na raça ainda fizemos a Edição 2003 do Campeonato do Nordeste. Vitória campeão, mas longo do brilho, qualidade e riqueza dos anos anteriores.

 

Depois de uma batalha judicial e mais de uma década, a competição voltou. Rapidamente mostrou que jamais devia ter sido interrompida. Aos poucos vem ganhando força, qualidade, exposição e, acima de tudo, relevância e respeito do mercado, mais notadamente de torcedores e patrocinadores. Uma alegria para o fã de futebol, não somente os torcedores dos clubes do Nordeste. Seguramente, a audiência da competição penetra Brasil a fora, ganhando espaço a cada ano. Vale ressaltar desde já que, não há qualquer chance de se construir uma propriedade esportiva de sucesso da noite para o dia. Leva tempo e a palavra mágica é CONTINUIDADE.

 

Infelizmente, parece que não aprendemos a lição. Dois clubes importantes da região anunciaram sua saída da Liga. Obviamente, isso enfraquece a competição tirando times de peso do evento. Por outro lado, esta atitude expõe talvez o maior problema do futebol brasileiro, que é a falta de entendimento por parte dos clubes de que eles não são únicos, não são autossuficientes. É preciso pensar na competição e, também, nos seus rivais. É da competição que vem todas as fontes de receita. Direitos de imagem, patrocínios, bilheteria, licenciamentos, até mesmo venda de jogadores.

 

Analisando a performance das equipes do Nordeste nos últimos anos, posso afirmar que o problema já passa longe da rivalidade Estaduais x Regionais. É uma questão de sobrevivência mesmo. É fundamental que estes clubes entendam que a Liga é o único caminho, a Copa do Nordeste já provou que dá certo uma vez, e está no caminho de provar novamente. Mas por que será que não damos o devido tempo? O tempo da maturação, do incremento das fontes de receita. Até mesmo para fazer mudanças pertinentes e necessárias, como por exemplo na forma de divisão e cotas?

 

Deixemos o financeiro de lado um pouco, vamos falar das consequências reais de tudo que falamos acima. Vamos falar da performance dos clubes do Nordeste nas séries A e B do brasileiro entre 1997 e 2016. Lembrando que entre 2003 e 2016 o sistema de disputa é por pontos corrido. A única mudança foi a redução gradativa para 20 clubes, feita entre 2003 e 2005. Entre 1997 e 2002 foram outras formas de disputa. A análise é simples. Leva em conta a performance dos clubes do Nordeste em participação em cada serie, participação na zona de rebaixamento e a evolução destes cenários.

 

Vamos lá, antes dos pontos corridos, equipes nordestinas representaram em média 12,6% dos participantes da serie A do brasileiro. No quesito rebaixamento, este número é bem superior, chegando a 25% média daqueles que foram rebaixados. Vale lembrar que, obviamente, o número de rebaixados é muito menor que participantes, logo, essa farta participação no rebaixamento, mostra tremenda inconstância. Nem é preciso falar sobre as consequências desse cai cai.

 

Durante o período de pontos corrido, a média de participação caiu 4,5% e a de participação entre rebaixados aumentou para 30,4%. Ora, menos participantes do Nordeste, caindo mais ainda. Simples assim.

 

Agora vamos à mesma análise, considerando a Série B, mas somente o período dos pontos corridos. Dividi em fase 1 e fase 2, cada uma com sete anos de competições, a fase 1 entre 2003 e 2009 e a fase 2 entre 2010 e 2016. A participação de clubes do Nordeste aumentou entre as fases 1 e 2. Subiu de 28,6% na fase 1 para 31,42% na fase 2. No quesito rebaixamento também houve aumento, subindo de 21,85 na fase 1 para 28,6% na fase 2 de participação de clubes nordestino no rebaixamento.

 

As conclusões são bem intuitivas. Na serie A cada vez menos temos a participação de clubes do Nordeste e, quando participam, caem em mais quantidade também. Consequentemente, temos mais clubes do Nordeste na Serie B, mas estes também tem caído mais, logo, se pensarmos no longo prazo, até mesmo na Serie B, teremos uma diminuição de clubes do Nordeste. Vale frisar também a questão qualidade, ou seja, poucos clubes e campanhas ruins.

 

Logo, é sim, uma questão de sobrevivência.

 

Tem saída? Claro!

 

Mas não é a que sempre tentam. Sempre tentam puxar a decisão para o melhor interesse individual de cada clube. Esse é o maior erro, como já dito acima. Nesse particular o Brasil andou na contramão desde o fim do clube dos 13. Enquanto existia, esta entidade fazia a negociação de forma conjunta. Sem entrar no mérito da qualidade do modele, posso afirmar que era melhor, muito melhor que a negociação individual. Esta por sua fez, aumentar o investimento do grupo de mídia detentor dos direitos, com consequente aumento também da diferença de valores recebidos entre os clubes.

 

A consequência é simples e fatal: cada vez menos competitividade, cada vez menos equipes com condições de vencer o campeonato, logo, cada vez menos interesse.

 

É fundamental que se pense na competição. Algo moderno, equilibrado, justo, com a variável da surpresa e do imprevisível. Particularmente, sou a favor dos pontos corrido para o brasileirão. Deixando o mata mata para Copa do Brasil e as competições internacionais.

 

Não teremos nada das soluções acima com posturas individuais. Com a tentativa de resgatar algo que ninguém quer. A grande saída para a Copa do Nordeste é revisitar o modelo de distribuição de receitas. Ainda no período de existência do Clube dos 13 fomos convidados para desenvolver uma nova metodologia de divisão de cotas. Durante meses estudamos, viajamos, conhecemos os mais diversos modelos de distribuição de receitas, suas premissas e estratégias.

 

Chegado o grande dia, ficamos 4 horas à espera dos presidentes terminarem sua reunião para, finalmente, apresentarmos nosso trabalho. Doce ilusão. Eles brigaram entre si, justamente por terem visto o draft de nossa metodologia. Justamente por conta do Grêmio estar voltando da série B e ter ficado, na simulação, dois clubes abaixo do Internacional.

 

Rasgaram um projeto caro, que poderia ter ajudado a virar o jogo. Inclusive da existência do Clubes dos 13. Que ironia, não?

 

Jogaram fora um projeto enorme tendo, justamente, a mesma atitude que dois clubes – Sport e Náutico – acabam de ter.

 

Curiosamente, o Clube dos 13 morreu, a Liga do Nordeste está ameaçada, mas esse trabalho, essa proposta segue viva e atual. Vai entender esse Brasil.

 

Sem falar que hoje o Internacional é que está na Série B e o Grêmio forte na Série A. Mais uma razão que prova a tese de que seja A, seja B é preciso ser forte e competitivo.

 

Somente assim o futebol do Nordeste poderá sair dessa descendente de 20 anos. Somente com a Liga e com a Copa do Nordeste fortes e crescentes essa tendência poderá ser revertida nos próximos 20 anos.

 

Por fim, sem um modelo moderno, em grupo e com foco na competição, nada mudará em nosso futebol.


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